terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Site acerca da psicoterapia existencial de Tereza Erthal

Deixo aqui a sugestão do site da minha mestra e orientadora na arte da psicoterapia existencial, Tereza Erthal. Site: http://www.psicoterapiavivencial.com.br/
Uma boa leitura a todos...
Marlos Cordova.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Curso de formação em psicoterapia existencial

               Nova Turma !  Início no dia 1o de fevereiro ( quarta-feira) às 14hs. Sob supervisão de Tereza Erthal, mestre em Psicologia, professora adjunta e supervisora clínica do Departamento de Psicologia da PUC-RJ. Psicoterapeuta, desenvolveu a Psicoterapia Vivencial, abordagem existencial com base no filósofo francês Jean-Paul Sartre.
               Maiores informações, entrar em contato pelo e-mail: etcerthal@gmail.com

Artigo da psicoterapeuta Tereza Erthal (1a parte)

EXISTENCIALISMO: TEORIA E PRÁTICA.
Tereza Erthal[1]

De acordo com Bornheim(em Erthal,1992), o homem atual está andando na corda bamba que se estende entre a segurança do humanismo triunfante, em busca de um eu autônomo,e, de outro extremo, os discursos sobre a dissolução do eu, sobre a robotização e a fuga que empurra o homem a sentir-se deslumbrado em deixar-se ser objeto. Historicamente, a ponderação sobre o humano é a ultima a surgir; antes vieram os astros.  Mas cada cultura inventa um homem e uma concepção da realidade humana afastada da fixidez dos astros. Os que buscam compreender o homem, tentam desenvolver concepções para entender as  expressões de sua instabilidade, interpretando a realidade humana como um conjunto de possíveis. Na verdade, são muitas as perspectivas de analise de tal realidade humana, dentro e fora da Psicologia: existe a História, a Antropologia, a Sociologia, a Filosofia. O homem é interdisciplinar e não há como esgotar esse entendimento através de qualquer pretensão de uma única visão.  Porque tais contribuições são plurais, isso não significa anular as suas próprias construções. O Homem é diálogo e toda a reflexão racional que busque dizer aquilo que ele é talvez tenha que partir do diálogo.
Nos tempos atuais, psicoterapias que exaltam a capacidade do homem de olhar para si de uma forma mais destemida e mais responsável, dando a ele um domínio maior de ação, têm sido mais disputadas. As pessoas estão, cada vez mais, procurando tratamentos que as levem a se responsabilizar mais por elas mesmas, entender a trama em que se envolveram na vida, buscando soluções mais ligadas ao presente, livres de tantas abstrações. Um olhar presentificado é o que se procura mais fortemente hoje, na tentativa de, mais do que resolver problemas diários, compreender e assumir as rédeas de sua vida.  Existencialmente falando, o individuo deve se responsabilizar por si e pelos outros, e deve ser levado a assumir a completude de sua liberdade.  “Terapia é pedagogia: cura e educa e nesse processo existe necessariamente a presença do outro.” ( Bornheim,em Erthal,1992)
  A Terapia  Existencial procura obter respostas especificas a perguntas especificas: Como o individuo escolheu viver a vida que vive? Como este sujeito experimentou a sua situação, de maneira única, propriamente a sua e de mais ninguém? As respostas dos deterministas se baseiam nas estruturas genéricas, mas isso não leva à compreensão de um exemplo individual. Não se pode reduzir uma pessoa a um único conceito explicativo genérico. Cada pessoa realmente tem uma forma própria de viver a situação escolhida. Não se trata de fazer o individuo tomar consciência de si, pois ele é um ser auto-consciente sempre nesta filosofia; trata-se sim de fazê-lo tomar conhecimento de si ( nem sempre a consciência é cognoscente). É a descoberta do Projeto Original: o que determinado individuo fez de si mesmo.
Cada escolha representa a minha decisão sobre a espécie de homem que eu sou, a vida que levo, o mundo em que vivo. Tais escolhas não são episódicas, mas, ao contrário, integram-se às demais em uma totalização em curso. Em um ato, por mais simples que seja, representa a pessoa inteira, expressa toda a realidade humana. Cada gesto representa o que somos inteiramente. Não vemos o individuo como uma coleção de traços (temperamento, desejo, emoção...), mas como uma unidade sintética. Dessa forma, o individuo não possui potências ocultas, revelando um aspecto de si de cada vez, enquanto as demais repousam. A realidade humana se anuncia pelos fins perseguidos (projeto). Não é o passado que determina quem somos, mas o futuro. Isso não quer dizer que a história não faça a sua contribuição, mas o peso é diferente do que em outras abordagens.  Ao homem cabe a plena consciência de sua livre escolha, consciência de sua responsabilidade e jamais ser visto como resultante de leis gerais. A sociedade humana é uma “anti-phisis”: ela não sofre passivamente a presença da Natureza,ela a retoma em mãos. Esta retomada de posse não é uma operação interior e subjetiva; efetua-se objetivamente através da práxis.
A Filosofia tinha posto o conhecimento como um fim e a razão como meio, construindo assim sistemas para chegar à essência das coisas. Isso levou à perda de contato com a existência mesma.   “a busca da essência não é se não um artifício dos homens que tratam de fugir da realidade, esquematizando-a; o pensamento não tem validade se não leva em conta quem o pensa”(Kierkegaard,1941)
O Existencialismo se propõe ao enfrentamento com o individual, irreptivel de cada ser, com sua existência. A famosa frase “A existência precede à essência, bem formulada por Sartre, expressa que o homem se faz a si mesmo. Sem duvida, Kierkegaard foi o pai desta idéia, mas sua obra pareceu perder-se, inicialmente; a ressonância do seu pensamento só apareceu após a primeira guerra. Heidegger ouviu o chamado e, de posse dos ensinamentos de Husserl sobre fenomenologia, construiu o existencialismo alemão. Mas ele também não teve seguidores imediatos. Após a segunda guerra, outro pensador influenciado por Husserl, segue os passos de Heidegger e traz uma nova contribuição: Jean-Paul Sartre. O Existencialismo não constitui  uma escola ,mas uma tendência a filosofar que se apresenta em diferentes lugares, através de diferentes homens: na Espanha, Unamuno e Ortega e Gasset; na Alemanha, Karl Jaspers; na França, Albert Camus e Gabriel Marcel; Buber e Berdiaeff, assim como outros, também foram deixando suas marcas.
Apresentado este panorama geral sobre a filosofia existencial, estamos prontos para examinar alguns de seus conceitos e método:
1.      Noção de Existência: núcleo básico do ser humano,o que realmente fica se lhe retiramos todos os contingentes. É o que fica como ultimo núcleo indefinível quando se tem prescindido de tudo que pode enumerar-se ou qualificar-se, uma vez que a existência cria tudo isso à medida do seu desenvolvimento.
2.      Liberdade: o Existencialismo parte da premissa de que os seres humanos não podem fugir à sua liberdade e que esta liberdade não é feita ao acaso, mas como uma escolha responsável. Por ela o homem escolhe o que quer ser e, assim, sua essência. O homem é o que se projeta ser e não existe antes deste projeto. Sartre denomina Projeto Original à escolha que a pessoa faz de si. “Liberdade é existência e nela a existência precede a essência” (Sartre,1943,p.433). O individuo se faz na medida em que  é feito pela situação e pelos acontecimentos. Ao mesmo tempo em que se define, é definido por outro e nessa mescla de passividade e atividade, precisa reinventar-se sempre.
3.      Consciência e transcendência: não sendo uma entidade, a existência  se constitui como uma relação constante consigo mesmo e com o mundo. Esta relação se caracteriza por sua transcendência. No latim, existire significa fora de, o que significa que existir é transcender-se. O existir humano é continua criação, um poder ser. O homem não está pronto,  precisa construir-se e este processo não é determinado por nada além dele mesmo. A consciência é definida como um vazio que se desliza para o objeto a que intencionalmente se dirige, na tentativa de se preencher. É uma visão relacional tendo em vista que a consciência não existe sem objeto, da mesma forma que o objeto não pode existir sem uma consciência (princípio da Intencionalidade de Husserl). A consciência é, então, mais um ato de captação do objeto nas formas de percepção, imaginação, emoção, etc. A amplitude desta captação indica que a consciência é sempre consciência do mundo. “O ego não está formalmente nem materialmente na consciência. Está no mundo- é um ser-do-mundo, como o ego do outro... É a consciência que torna possível a unidade e personalidade do meu eu. .. A existência da consciência é um absoluto porque a consciência é a consciência de si mesma... O objeto está frente à ela com sua opacidade característica, mas ela, ela é pura e simplesmente consciente de ser consciente desse objeto, tal a lei de sua existência.”( Sartre, 1936,p.22) Existe então a consciência irreflexiva,de primeiro grau,que é uma consciência  vaga, não posicional de si; e a consciência reflexiva, ou de segundo grau, que é a consciência de se ter consciência de algo.
4.      O ser-no-mundo: o homem não existe só, nem em relação exclusiva com sua corporeidade. Ele é um ser-no-mundo que cria o mundo, mas, ao mesmo tempo, é criado por ele. O mundo e o homem são, na verdade, um só; não poderiam existir à parte. O ser só existe na medida em que tem um mundo e vai criando este mundo na medida em que é consciente dele. O mundo é um conjunto de relações com os demais e com as coisas que se vão tecendo na vida de cada ser à medida que ele vai  desenvolvendo na existência sua concepção de mundo e de si mesmo: seu projeto de ser.
5.      A angustia e o nada: é um fato ontológico, uma característica do existente como tal. A angustia de liberdade conduz o individuo a procurar-se nas coisas, o que é uma maneira de fugir de si mesmo. Longe de ser considerado um sintoma patológico, trata-se de uma valiosa experiência já que, ao aparecer, nos faz conscientes de nossa existência e nos obriga a vivê-la como tal. É o medo de nada, já que diferente do medo, não tem um objeto especifico. Surge quando o nada irrompe e comove o nosso ser. O nada é o que determina a existência das coisas. Sartre nos diz: “O que conta em um recipiente é o seu vazio interno.” É o que não existe que determina a construção do que existirá.
6.      Culpa: também ontológica, aparece quando o individuo falha na realização de suas possibilidades, quando renuncia a sua liberdade e se aceita objeto.
7.      Método fenomenológico: método proposto por Husserl que se indignava com a utilização do método das ciências naturais aplicados a tudo, especialmente à Psicologia. Por meio da reflexão, podemos nos isolar do exterior e dirigir nossa atenção à nossa consciência. O foco não é o objeto externo, mas a vivência que temos dele, o ato mesmo pelo qual o percebemos e o conhecemos. Isso livra a percepção das limitações de perspectiva. O conhecimento é direto, intuitivo, sem necessidade de qualquer significação, já que o sujeito e o objeto são um só e o conhecimento se fixa no ato de conhecer. Mas para isso é necessário colocar entre parênteses tudo o que possa vir a interferir neste processo de captação; todo o nosso próprio estado psicológico. Chamou este processo de redução fenomenológica que extrai tudo o que é externo ao processo de vivência. Assim, conhecer absolutamente algo é ser capaz de captá-lo em todos os seus aspectos e características. O conhecimento comum capta apenas parcialmente, enviesadamente, enquanto que a forma proposta por Husserl  capta o próprio ato captador: a consciência do objeto. O que se investiga e quem investiga, sujeito e objeto são um só, pertencendo à mesma corrente de consciência e, portanto, podemos chegar a conhecer absolutamente. Se podemos chegar a conhecer absolutamente o ato de conhecer, podemos chegar ao conhecimento absoluto do objeto. Como método terapêutico, é uma forma de captação da realidade do cliente, tal como é vivida por ele, através do seu olhar. Na verdade, esse é o maior objetivo da terapia: a compreensão do mundo de cada sujeito, tal como ele o vivencia. Ajusta-se, pois, como um método que estuda o individuo como ser-no-mundo, como existente, e a captação do sentido do seu projeto de ser.



[1] Mestre em Psicologia, professora adjunta e supervisora clinica do Departamento de Psicologia da PUC-RJ. Psicoterapeuta, desenvolveu a Psicoterapia Vivencial, abordagem existencial sartriana ; autora de vários artigos e livros publicados dentro e fora do pais.

Artigo da psicoterapeuta Tereza Erthal (2a parte)

   Existencialismo na Psicoterapia:

  Esta abordagem é baseada na compreensão do cliente como uma totalidade; os fatos particulares nada significam. O objetivo é descobrir as mediações para compreender o individuo concreto singular. Procura compreendê-lo como criador do seu mundo e de si mesmo. Assim, detectando os padrões comportamentais, chegamos ao projeto original pelo qual o individuo se faz uma pessoa. O individuo se define por seu projeto, por ser capaz de fazer e desfazer o que fizeram dele. O objetivo é decifrar os comportamentos empíricos do individuo, isto é, dar luz às revelações que cada um deles contem .”( Erthal,2010,p.210) Seu ponto de partida é a experiência; seu ponto de apoio é a compreensão pré-ontológica e fundamental que o homem tem da pessoa humana. Tenta descobrir, de forma rigorosamente objetiva, a escolha subjetiva pelo qual uma pessoa se faz uma pessoa. Para tal, usa um método comparativo e descritivo, o método fenomenológico, como um meio de compreender a realidade transformada em uma atitude terapêutica fundamental. Cada conduta simboliza a escolha fundamental e, ao mesmo tempo, cada uma delas esconde esta eleição sob seus caracteres ocasionais e sua oportunidade histórica, de forma que é pela comparação delas que chegaremos à revelação do que elas expressam..
   Como a vivência é o ponto mais importante deste trabalho, a ênfase só pode estar no momento presente. A concepção é do tempo dinâmico: o presente não é estático, já que contem o passado e o futuro enquanto percebidos pela pessoa. A grande importância da presença do terapeuta está em que ele espelha as intenções de seu cliente; descreve seu experienciar conforme expresso na relação. O terapeuta é a testemunha ocular do compromisso que o cliente passa a estabelecer consigo mesmo. Entre ambos existe uma ligação fundamental e nela se manifesta uma modalidade de presença do outro irredutível ao conhecimento que se tem do objeto. “O outro é, por principio, aquele que me olha.” Sartre(1945,p.315) Este olhar remete o cliente a si mesmo.
       A compreensão empática é o pilar do encontro terapêutico. Possibilita a percepção do sentido concreto e vivencial do mundo pessoal que o cliente se atribui, permitindo a compreensão molar de seu discurso. Não há uma analise reflexiva ou mediações lógicas, mas a percepção sintética e imediata do vivido pelo cliente. A empatia é essa comunhão afetiva na qual um se coloca no lugar do outro para perceber o seu mundo fenomênico... A autêntica redução fenomenológica se faz possível pela compreensão empática... (Erthal,2010,p.216)  Inicialmente, o terapeuta permite que parte de si se torne o cliente. Depois,constrói um modelo para o cliente,uma replica de suas observações e insights e transforma as palavras do cliente em imagens e sentimentos de suas lembranças e expressões. Sua atenção está focada naquilo que o cliente provoca nele através de suas expressões verbais e não verbais...(Erthal,p.217)
   A cura é a aceitação da condição humana (conjunto de limites que informa a nossa situação no universo), que é o surgimento do ser no nada. É encontrar em si mesmo os valores, é não fugir da liberdade como tal, nem deixar-se escorregar pela desculpa da essência. De posse do seu auto-conhecimento, o cliente se faz consciente daquilo que deseja modificar em si mesmo, pois se sente com capacidade para tal,seja mudando o seu projeto, seja usando outras maneiras de ser para realizá-lo.
  “As contribuições nucleares desta filosofia podem ser descritas como liberdade, escolha, risco, angustia, culpa, etc, como expressões de uma compreensão de si (em Kierkegaard), como expressão de uma busca de uma filosofia da existência (Heidegger e Jaspers), e como preocupação de analisar a pessoa concreta e única (Sartre).( Erthal,2010,p.205)
   Como expressões da aplicação deste pensamento à pratica clinica, encontramos L. Binswanger, M.Boss, E. Minkowisky,V. Frankl, R. Laing. Rollo May introduziu estes autores nos Estados Unidos, mas esta importação sofreu uma aclimatação aos valores da cultura americana já embebidas nas idéias humanistas.
   Não podemos dizer que exista uma única terapia existencial, mas varias formas de colocar seus pressupostos em prática. Assim como na filosofia existe uma unidade nas aparentes divergências, nas diversas modalidades de terapia existencial isso também ocorre. A diferença radica na forma como o terapeuta compreende o processo e o centraliza na prática.  Binswanger define terapia como “um tipo antropológico de investigação cientïfica, isto é, em que está dirigido à essência do ser humano” (1958,p.191)Utiliza-se da conceitualização heideggeriana. Yaloom nos fala do confronto do individuo com os dados da sua existência que, para ele,  constitui o conflito dinâmico existencial. Uns se apóiam no conhecimento filosófico de Heidegger, outros em Kiekegaard, ainda que outros,  em Sartre.
A questão não está em qual filosofia é melhor, mas qual prática se ajusta mais a minha forma de enxergar o ser humano. Como Sartre mesmo diz, “Não importa muito aqui que exista a psicanálise existencial (como ele definiu); o importante para nós é que seja possível”. (1988,p.46)  

Referências bibliográficas:
        Binswanger,L. The Existential Analysis School of Thought. In: R. May et al,      Existence, New York, Basic Books, 1958.
Bornheim,G. A Vez do Leitor. In: Tereza Erthal, Contas e Contos na Terapia Vivencial,Petrópolis,Vozes Editorial,1992.
Erthal,Tereza. Trilogia da Existência. Curitiba, ed. Honoris Causa,2010.
Kierkegaard,S. Tratado dela desesperacion. Buenos Aires/Santiago, Rueda,1941.
Sartre,J.P. L’Être e tel Néant. Paris, Gallimard, 1943.
Sartre,J.P. La Transcendance de L’ego. Paris, Recherches Philosophiques,1936.