terça-feira, 3 de julho de 2012

O risco

         O ser humano muitas vezes busca ter garantias na vida - garantia de uma escolha correta; garantia de que será feliz ou mesmo ter a garantia de que não vai sofrer. São tentativas diante da ameaça da própria existência, uma vez que realizando escolhas, ele entra em contato com risco, com a incerteza do seu resultado. Incerteza esta que é geradora de angústia.
            A maneira com ele procura evitar sua angústia é diminuindo suas possibilidades de escolha, ou seja, deixando de interagir com os acontecimentos. Como se quisesse negar sua liberdade para se transformar num objeto. Possibilidade que acaba levando ao sentimento de culpa, que na realidade é o fracasso do próprio projeto – escolhe o não-ser na ilusão de evitar o sofrimento. Contudo, tal escolha faz com que ele perca o contato consigo mesmo. Não conseguindo perceber a si mesmo, não há como reconhecer suas reais possibilidades existenciais, que de uma certa maneira acaba gerando sofrimento.
            Se a liberdade parte da própria consciência, então, a autoconsciência se faz necessária para que a pessoa possa reconhecer seu ser-no-mundo, que a angústia não é uma doença ou fenômeno anormal, mas algo ontológico ao ser humano, ou seja, um modo de ser diante do nada. Nada que é expresso pela incerteza do resultado, do embate com o não-ser, medo de perder os outros e também medo de se perder no outro. Portanto, o reconhecimento da angústia como fazendo parte do seu ser faz com que ele aumente sua liberdade de escolha e, por conseguinte, aceite correr o risco de ser.
            A filosofia existencial tem como premissa que a vida é o risco. Correr o risco a todo o momento realizando escolhas ou tentando evitá-las. Estar cônscio que apenas ele é quem pode realizar seu projeto é o grande risco, uma vez que o reconhecimento da liberdade assusta. Como Erthal cita: “A liberdade é uma conquista do homem, mas que ao mesmo tempo o assusta. É livre para se criar e está livre para executar seu projeto. Desocultando-se, permite-se realizar a sua autocriação. Esse é o principal risco” (ERTHAL, p.50, 1999). O grande temor e tremor do ser humano é o reconhecimento dessa liberdade, que ele está sozinho e que mais ninguém pode arriscar por ele.
            A psicologia existencial que se utiliza da filosofia existencial como orientação na sua atuação, propõe uma ampliação da autoconsciência no sentido de aumentar o potencial de escolha; auxilia ao cliente no aspecto de descobrir-se e de autogerir-se; é ajudá-lo a aceitar os riscos de suas próprias escolhas responsáveis e aceitar a liberdade para realizar sua (re) construção para existir.  
            Para alcançar tal ampliação, se faz necessário passar por algumas etapas que procuraremos explicar como intuito de compreensão.
            Num primeiro momento, existe uma desorganização do conteúdo expresso pelo cliente. O problema é descrito, comumente existe uma atitude bastante crítica com relação à auto-imagem, não há nesse momento conscientização que ele faz parte do problema. Limita-se a descrever os problemas sem entrar em contato diretamente com eles. Uma atitude racional domina o sentimento bloqueando-o de encontrar sua verdade.
            Em seguida, existe uma maior exploração do problema. Este agora faz parte do cliente. Há um questionamento dos valores atuais e uma nova maneira emerge com o modo atual de existir. As contradições são reconhecidas e fazem com que o cliente busque uma forma mais consciente do eu para perceber melhor o seu comportamento.
            Uma organização começa a surgir do momento que o cliente modifica o foco para si mesmo. O que antes era desorganizado passa a ter uma organização do ponto de vista de significação pessoal. Claro que não é acabando com os problemas que o cliente atinge o crescimento, mas sabendo que eles existem e que tem capacidade resolvê-los à medida que vão aparecendo. Ele reconhece suas limitações, sem deixar de buscar um melhor aprimoramento. Razão e sentimento passam a ser integrados. O cliente agora consegue aceitar a si mesmo.
            Acreditamos assim que uma maior tomada de consciência por parte do cliente, faça com que ele reconheça suas próprias capacidades existenciais. Capacidades que são reconhecidas a partir de um contato maior consigo mesmo, que a angústia faz parte do seu ser e que precisa correr os riscos pelas escolhas efetuadas. À medida que ele adquire maior consciência do que está fazendo e como está fazendo, poderá ser mais responsável por sua experiência; o foco deixa de ser o externo, passando a dar maior valor a experiência pessoal como referência de suas decisões. Confiando mais em si mesmo, poderá arriscar-se. O eu agora é visto como processo e não mais como um objeto.

Referência Bibliográfica:

ERTHAL, Tereza Cristina. Terapia vivencial: uma abordagem existencial em psicoterapia – Petrópolis, RJ: Vozes, 1989.