sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

O momento da alta

         O findar da terapia geralmente representa uma conclusão de metas estabelecidas. O cliente ao longo do processo terapêutico construiu mudanças significativas, aprendeu a lidar melhor com situações antes temidas e, por conta disso, um sentimento de bem-estar inunda seu ser. Torna-se assim natural e ao mesmo tempo temido também o desejo por experimentar suas novas habilidades fora do “setting” terapêutico.
 Quem define o momento da alta? E sob qual critério? Isso nos remete aos modelos de terapia. Temos o modelo médico no qual o profissional define o melhor momento para conceder à alta e o modelo psicológico que acredita na capacidade do próprio cliente para definir quando interromper sua terapia. Na primeira situação, o cliente poderá se sentir abandonado ou rejeitado pelo terapeuta. Por outro lado, um sentimento de alívio pode acometê-lo, uma vez que a responsabilidade pela interrupção parte do profissional. Já no segundo caso, é o cliente quem define o momento da interrupção - a responsabilidade agora está nas mãos do cliente. Ele decide quando interromper seu tratamento. Decisão que, no entanto, não o livra da dúvida ou da incerteza, senão para o risco, pois, estará sozinho enfrentando seus problemas.
A terapia vivencial – psicologia existencial baseada na filosofia de Jean-Paul Sartre – estabelece o cliente como à pessoa mais qualificada para decidir o momento da alta. Erthal versa a respeito: “Na terapia vivencial, a alta é dada pelo próprio cliente que é considerado a pessoa mais adequada para se avaliar, atingindo o crescimento” (ERTHAL, p.147, 2004). Se nessa abordagem existencial enfatizamos a autonomia e a responsabilidade do cliente, estaríamos nos contradizendo se determinássemos o momento da interrupção do tratamento. Cabe assim ao cliente escolher o momento para interrompê-la.
Mas o cliente não pode equivocar-se levantando prematuramente o término do tratamento? Claro que pode! Daí a importância duma discussão franca com o terapeuta para auxiliá-lo na sua decisão. Visto que, existe uma diferença entre o cliente que levanta o assunto da alta para o cliente que já definiu o momento de parar. A questão é que alguns términos tornam-se prematuros. Comumente, clientes alegam não ter mais nada para falar ou não percebem a ligação do trabalho realizado com os problemas vivenciados. Alguns indícios servem para sinalizar um desejo para interromper o tratamento: atrasos e faltas constantes, baixa produção, etc. Entretanto, tais comportamentos podem representar uma forma do cliente chamar a atenção do terapeuta. O cliente pode sentir-se pouco apoiado, triste com suas descobertas, ou mesmo tentando evitar entrar em contato com a sua ansiedade. Até mesmo a situação financeira pode ser usada como desculpa para evitar falar sobre seu descontentamento com a terapia.
Como mencionamos anteriormente, é de suma importância uma discussão no sentido de esclarecimento para o cliente acerca da sua decisão, pois, talvez, haja alguns aspectos nebulosos que necessitem de uma melhor compreensão. Alcançar tal compreensão pode dissipar dúvidas e fortalecer sua decisão. No entanto, alguns clientes, por exemplo, ficam na dúvida em interromper seu tratamento pelo medo de perder o contato com o terapeuta. Relutam interromper a terapia, pois, desta maneira, ainda conseguem manter o vínculo. Outros levantam a questão da alta precipitadamente por repetição de comportamentos anteriores – abandonaram atividades anteriores por medo do fracasso, ou por causa da ideia de que não conseguirão alcançar seus objetivos. E também clientes que podem passar por dificuldades financeiras – questão comum nos dias de hoje – a ponto de ameaçar a continuidade do tratamento. Em todos os exemplos citados, é importante que o terapeuta, com sensibilidade, possa junto com o cliente chegar numa melhor compreensão para ajudá-lo na sua decisão. Deixar o cliente bem à vontade no sentido dele desejar manter contato com o terapeuta mesmo após a alta e que ficaria feliz por acompanhar seu desenvolvimento (Lembrando que caso ele precise retornar à terapia não se trata de retrocesso, mas um recomeço); levar o cliente à percepção do comportamento sabotador, e que a interrupção da terapia seria mais uma fuga de si mesmo, e que a questão financeira pode ser revista junto com o cliente – posição particular de cada terapeuta – para não atrapalhar no seu desenvolvimento. Em todo caso, sempre o cliente escolhe o momento da alta. Cabe ao terapeuta, respeitar e acolher sua decisão. Atitudes estas que reafirmam à máxima do existencialismo sartreano, qual seja, a LIBERDADE.       


Referência Bibliográfica:

ERTHAL, Tereza Cristina Saldanha. Treinamento em Psicoterapia Vivencial; Livro Pleno, São Paulo, 2004.