terça-feira, 17 de dezembro de 2013


                          Devemos reconstruir nossa existência                         
 

            Gostaria de falar sobre reconstrução. Reconstrução que nos remete a ideia de que precisamos construir novamente, pois o que antes servia para o nosso propósito, agora, deixou de ter sentido. Aquele lugar que outrora era tão confortável tornou-se estranho, como se ele não pertencesse mais ao nosso ser ou talvez seja o nosso ser que não queria mais fazer parte dele. Mas afinal, que lugar é este? O lugar no qual me refiro, não é concreto; não é feito de tijolos e muito menos possui portas ou janelas. Refiro-me aqui ao Ethos, a morada que cada um de nós habita: nossa própria existência. Existência que é expressa por uma consciência e que necessita de um corpo para existir, haja vista que não existe consciência sem um corpo para habitá-lo, assim como o corpo precisa de uma consciência para existir no mundo. Diante disso, estamos condenados a conviver com a nossa própria morada, com a nossa própria existência. Não podemos escapar de nós mesmos: esta é a sina que carregamos.

Se não há a menor possibilidade de encontrarmos um atalho, um escape que seja de nós mesmos, então parece que só nos resta aceitarmos nosso próprio convívio, quem somos. Mas um momento! Quem somos?  O que nos define? Filósofos da antiguidade já haviam tentado buscar uma resposta para tal enigma, algo que revelasse nossa unidade, nossa essência. E nessa busca dois filósofos se destacaram: Heráclito e Parmênides. O primeiro propõe o ser humano como um vir-a-ser, ou seja: em constante mudança. Uma vez que com o passar do tempo, a maneira dele perceber as coisas e situações se modificaria. A cada nova visada ele estaria transformando não só os fenômenos percebidos, mas, principalmente, a si próprio. Já o segundo estabelece o ser humano como permanência: ele é e não se modifica, pois ele nasce humano e morre humano. Sua essência já estaria definida de antemão, não havendo assim o que modificar. Divergências filosóficas à parte, ambos parecem ter certa razão: somos humanos e não vamos deixar de sê-lo, e nos modificamos quando transformamos nossa maneira ver o mundo. Então, já que não temos condições de abandonar nossa condição humana - a não ser por um projeto de morte -, pensemos em nosso projeto em vida: a possibilidade de transformação.

Transformação aqui proposta não como um destino ou como uma contingência da vida, mas como atitude da nossa própria práxis, da nossa própria consciência enquanto direcionada para nós mesmos: refletir como somos e para onde escolhemos seguir. Não que com isso devemos dar de ombros para a nossa história de vida, não é o caso. Ela até certo ponto foi necessária para nossa construção. Digo até certo ponto porque não precisamos ficar estacionados na mesma história, temos o dever de assumir o comando da nossa própria história, escolher como queremos ser e para onde ir. E só conseguiremos tal façanha pelo nosso próprio ato reflexivo, pela nossa consciência. É através dela que criamos condições para alcançar uma melhor compreensão de nós mesmos. Compreensão que não deve ser vista como sinônimo de mudança, longe disso. Até porque qualquer mudança realizada sempre precederá de uma ação, pois não há mudança sem que não haja escolha anteriormente. Para mudarmos, precisamos mais do que o desejo pela própria mudança. Precisamos agir com coragem para conseguirmos nosso intuito. E quando fazemos isso, transformamo-nos em heróis de nós mesmos, destruímos – mesmo que temporariamente – o nosso vilão interno para vencermos a nós mesmos. E talvez esta seja a verdadeira batalha que devemos travar: a reconstrução da nossa própria existência. Uma reconstrução solitária, tácita, mas que acima de tudo é necessária para o nosso desenvolvimento. Pensemos nisso e façamos a nossa escolha...